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segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Formado em academia militar é dispensado por objeção de consciência

Michael Izbicki
A pergunta que mudou a vida de Michael Izbicki surgiu num exame psicológico que ele fez pouco tempo depois de se formar em 2008 entre os melhores de sua turma na Academia Naval dos EUA: se recebesse a ordem, ele lançaria um míssil com ogiva nuclear?

O guarda-marinha Izbicki respondeu que não – e sua resposta deu início a uma jornada pessoal e a uma batalha legal de dois anos que terminou na terça-feira, quando a Marinha confirmou que ele havia sido dispensado do serviço por objeção de consciência.

Nesse processo, Izbicki, 25, deixou de ser um aspirante na tropa de submarinos nucleares, onde estudava taxas de mortalidade, para se tornar morador de uma pequena comunidade Quaker pacífica a poucos quarteirões do Rio Thames, onde ele reza várias vezes por dia, estuda hebraico e ajuda na horta orgânica.

Ele é um dos poucos formados pelas academias militares do país a serem dispensados por objeção de consciência nos últimos anos. E embora cada caso seja profundamente pessoal, sua longa batalha por uma dispensa honrada oferece um vislumbre de um lado raramente visto da experiência militar na era pós-serviço obrigatório, em que todos são voluntários: o incrível desafio que todos os membros do serviço enfrentam – especialmente os formados nas academias militares – ao se matricularem ainda adolescentes para se tornarem guerreiros e depois mudarem de ideia sobre sua disposição para matar na vida adulta.

A Marinha lutou duro contra seu pedido, quase da mesma forma que o Exército contestou o requerimento de objeção de consciência do capitão Peter D. Brown, um formado em West Point e veterano de guerra do Iraque que foi dispensado em 2007 depois de uma batalha demorada no tribunal.

Os formados na academia militar responderam por apenas uma dúzia dos cerca de 600 requerimentos para dispensa por objeção de consciência entre 2002 e 2010, disseram porta-vozes dos diversos ramos do serviço militar. Desses pedidos, menos da metade foram aprovados. E como muitos outros requerentes da academia, de acordo com advogados que lidam com casos desse tipo, Izbicki recebeu a dispensa só depois de levar seu pedido a um tribunal federal.

A Marinha rejeitou o requerimento de Izbicki duas vezes, questionando a sinceridade de suas crenças apesar do apoio de vários capelãos da Marinha e do testemunho de dois membros da Yale Divinity School que disseram que suas convicções religiosas lhes pareciam maduras e sinceras.

Um comandante da Marinha sugeriu que a tendência pacifista do tipo de cristianismo que Izbicki abraçou era inconsistente com a fé cristã comum. O mesmo comandante comparava os Quakers, que apoiaram Izbicki, ao culto suicida do reverendo Jim Jones e seu Templo do Povo.

J.E. McNeil, diretor-executivo do Centro de Consciência e Guerra, uma organização sem fins lucrativos de Washington que ajuda os membros do serviço militar a passarem pelo processo de objeção de consciência, disse que um caso como o de Izbicki representa um desafio profundo para os militares.

“Até então você era alguém que eles achavam que seria um líder”, disse McNeil. “Eles passaram quatro anos o treinando. E agora você não quer ter nada a ver com aquele mundo.”

A União Americana das Liberdades Civis do Connecticut, que entrou com um processo federal em prol de Izbicki em novembro pedindo a revogação da decisão da Marinha, anunciou na terça-feira que a Marinha havia concedido a dispensa. Izbicki, que continuou trabalhando numa função de escritório da Marinha, pode ter de reembolsar o serviço militar, parcial ou totalmente, pelos gastos com sua educação, disseram suas advogadas, Sandra Staub, diretora-legal da ACLU do Connecticut, e Deborah H. Karpatkin e Vera M. Scanlon, de Nova York.

Mike McLellan, porta-voz da Marinha, disse que Izbicki havia sido dispensado por objeção de consciência porque “o Comando de Pessoal da Marinha determinou que havia provas suficientes para satisfazer as exigências para a dispensa e determinou que dispensá-lo fazia parte dos interesses da Marinha.”

Izbicki, finalista da Bolsa Nacional de Mérito no colegial, escolheu a academia naval de Annapolis, Maryland, entre vários outros colégios, incluindo o Instituto de Tecnologia da Califórnia, que ofereceu a ele uma bolsa de quatro anos, porque ele sentia a obrigação de servir seu país durante a guerra, disse aos investigadores durante seu pedido de dispensa.

Ele cresceu frequentando missas cristãs em San Clemente, Califórnia, e continuou frequentando a igreja durante seus quatro anos na academia, onde o cristianismo é a religião dominante. Os cadetes devem estudar a teoria da “guerra justa” em seu primeiro ano, uma doutrina que justifica a ação militar, baseada principalmente nos escritos de Santo Agostinho e São Tomás de Aquino.

Foi só em seu último ano que Izbicki registrou uma sensação de incômodo em relação à “franqueza com a qual as pessoas falavam sobre matar”, disse ele em seu requerimento. Ele escreveu: “o treinamento não fez jus aos ideais de guerra justa da forma como eu os imaginava. Eu via fórmulas para calcular o número e os tipos de mortes que resultariam de usar cada um dos sistemas de armas. Nós calculávamos a extensão das mortes de civis e se esses números eram politicamente aceitáveis.”

Ainda assim, disse Izbicki, ele continuou convencido de que as crenças cristãs poderiam se reconciliar com a cultura militar e que, enquanto oficial, ele seria capaz de promover a mudança a partir de dentro.

Depois de se formar na academia, ele recebeu um diploma de mestrado em engenharia da computação na Universidade Johns Hopkins em preparação para o que ele esperava que fosse uma carreira em submarinos nucleares.

Mas Izbicki disse que também começou a explorar seu compromisso com o cristianismo. Ele estudou os Evangelhos, leu muito sobre a história antiga da igreja, fez aulas de hebraico para poder ler o Velho Testamento no original e começou a medir sua fé de acordo com o fundamento evangélico: “o que Jesus faria?”.

Foi sob essa luz que ele se deparou com o exame que questionava sobre o lançamento de um míssil nuclear, no começo de 2009, logo depois de ter sido designado para a escola para marinheiros de submarino no Comando de Treinamento em Poder Nuclear em Charleston, Carolina do Sul. Ao ver a pergunta colocada daquela forma, ele disse que foi impossível esconder seu pacifismo emergente por mais tempo.

“Eu percebi que não poderia ser responsável por matar ninguém”, explicou mais tarde.

Sua resposta o levou a um teste psicológico e a uma consulta com um capelão da Marinha, que foi o primeiro a sugerir que Izbicki considerasse pedir dispensa por objeção de consciência.

“Eu nunca tinha de fato ouvido falar nisso”, disse Izbicki, um homem reservado e de fala mansa, numa entrevista na semana passada na Casa de São Francisco, uma residência Quaker. “Era uma daquelas coisas que as pessoas faziam nos anos 60.”

As transcrições das audiências de seus dois requerimentos de dispensa – que em parte se parecem com uma corte marcial, e em parte com provas orais para um doutorado – têm mais de 700 páginas. Eles incluem perguntas esotéricas sobre a teoria da “guerra justa”, as cartas de São Paulo e os protocolos conhecidos como as Seis Habilidades da Estratégia Marítima da Marinha dos EUA.

As crenças de Izbicki foram questionadas intensamente em busca de inconsistências e desvios da fé cristã conservadora.

Um investigador, o tenente comandante John A. Price, expressou surpresa quando Izbicki disse que não estava convencido de que todas as palavras da Bíblia foram inspiradas por Deus. Ele questiona como Izbicki pode ter certeza, então, de que o Sermão da Montanha, no qual ele baseia seu argumento de saber o que Jesus faria, é acurado: “você percebe que há um perigo quando começa a acreditar que algumas coisas na Bíblia não são verdade, porque então você pode começar a acreditar que Jesus não é verdade”.

Em outro momento, Price pergunta: “se Jesus foi um pacifista, porque ele não disse para todos os soldados romanos deixarem o exército?”

Oficiais da Marinha tentaram persuadir Izbicki a considerar alternativas à dispensa: talvez ele pudesse se tornar um oficial médico ou um dentista da Marinha? Ele respondeu que suas crenças pacifistas eram irreconciliáveis com qualquer esforço para preparar tropas para a batalha.

“Eu não poderia contribuir de forma alguma”, disse ele.

Izbicki disse que não havia feito planos para o futuro a não ser voltar para a casa de seus pais na Califórnia. Sua dispensa, disse ele, “abriu o mundo todo para mim”.

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