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terça-feira, 18 de setembro de 2012

Le Monde: Francesa narra seus dias passados nas mãos de sequestradores que retém o marido há 2 anos


Daniel Larribe (o segundo da direita para esquerda) em poder da Al-Qaeda no Níger 
Faz dois anos que quatro franceses sequestrados em Arlit, no norte do Níger, foram feitos reféns pelo grupo AQMI (Al-Qaeda no Magreb Islâmico): Thierry Dole, Marc Féret, Daniel Larribe e Pierre Legrand. No sábado (15), suas famílias lançaram, pela primeira vez, um apelo público. Françoise Larribe, sequestrada junto com seu marido Daniel e depois libertada ao final de 160 dias, fala sobre seus dois anos de angústia.

Le Monde: Após sua libertação, dentre os familiares de reféns a senhora foi a que mais se opôs à midiatização. Por que aceitá-la, hoje?
Françoise Larribe: Pude ter uma ideia de quem estávamos enfrentando justamente porque eu vivi essa situação. Será que a midiatização não daria uma onipotência aos sequestradores? Os especialistas também nos diziam que não era a melhor coisa a fazer. Depois, há alguns meses, recebi uma carta de Daniel; era pessoal, mas os sequestradores se certificaram de que eu a recebesse. Vi ali um sinal. Foi isso que desencadeou.

Já havia acontecido esse encontro com Alain Juppé, na época ministro das Relações Exteriores, onde ele nos explicou que a midiatização havia ajudado os reféns no Afeganistão. Não sabíamos mais no quê acreditar. Uma semana atrás, um novo vídeo, onde os quatro reféns pediam por ajuda, quebraram minhas últimas resistências.

Le Monde: A senhora aceita falar sobre seu sequestro?
Larribe: Detestei o que li na imprensa ao voltar. Pode parecer insignificante, mas diziam que eu me debatia gritando. Eu não estava contente de subir no carro, é verdade, mas não foi nada disso que aconteceu. Eram 3h15 da madrugada. Eles entraram na casa aos chutes, com kalashnikovs. Daniel saiu na hora. Eles vieram depois me buscar no quarto, me levando do jeito que eu estava, descalça e de pijama. Daniel já estava deitado na picape quando me fizeram entrar. Eu nunca havia visto um olhar como o seu: ele não imaginava que eles também me levariam.

Le Monde: A senhora foi para o Níger para acompanhar seu marido?
Larribe: Daniel é engenheiro de minas. Ele tinha 54 anos quando a Areva o contratou como diretor de produção de urânio em 2005. Ir para o Níger era uma ideia que nos agradava, já havíamos vivido na África; nossas filhas eram estudantes. Eu trabalhava com inserção social, e também com pintura. Nós passamos quatro anos em Arlit cercados de amigos, com finais de semana no mato.

Daniel foi transferido para a Namíbia e depois, ao final de dezoito meses, a Areva nos propôs que voltássemos para o Níger. Ficamos felizes com isso, ao mesmo tempo em que sabíamos que a vida seria diferente: no meio tempo, houve a emergência da rebelião tuaregue, o caso Michel Germaneau [sequestrado pela AQMI e morto em cativeiro em julho de 2010]. Tudo havia mudado em Arlit, recebemos instruções, como não sair da zona protegida. Pensávamos estar em segurança ali.

Le Monde: Como a senhora descobriu a identidade de seus raptores?
Larribe: Depois de nosso sequestro, rodamos por pelo menos dois dias. Em uma das paradas, o tradutor nos perguntou em seu francês impecável: “Somos da AQMI. Sabem o que é?” Na véspera de nosso sequestro, eu havia... lido um artigo apavorante sobre eles, eram apresentados como sanguinários, sobretudo o chefe Abou Zeid. O intérprete fez um gesto: “Estão vendo ali, naquele carro? É o Abou Zeid.” Eu pensei comigo mesma: “Merda”. Logo descobrimos que o objetivo não era nos matar, que éramos reféns. Sempre nos trataram corretamente, eles tinham esse cuidado com sua própria imagem, nos mostrar vivos e com boa saúde. Eles também queriam dizer: “Temos como mantê-los o quanto quisermos. Temos todo o tempo do mundo”.

Le Monde: Vocês conheciam os outros reféns?
Larribe: Não. Eles trabalhavam para uma empresa terceirizada da Areva, viviam em uma base, enquanto nós ficávamos na cidade, no bairro dos executivos. Depois de quinze dias, fomos separados em dois grupos. Estávamos em três, junto com Thierry, um engenheiro que vinha da Martinica. Deve ter sido difícil para ele, ele devia se sentir sozinho diante de um casal. Eu conheci o Daniel aos 20 anos, somos muito ligados. Foi uma experiência passar por essa situação a dois: nossas relações permaneceram as mesmas, mas Daniel se sentia responsável pelo que havia acontecido.

Junto com Thierry, tentamos encontrar uma rotina aceitável para os três, marcada por um rigoroso emprego do tempo, com momentos a sós e outros juntos, como nas refeições. Vivíamos no deserto, às vezes trocando de lugar, parando no meio do nada. Depois de dois meses, ganhamos o direito de fazer fogo, ou seja, procurar lenha, preparar chá. Isso nos pareceu uma mudança maravilhosa, que ajudava a preencher o vazio total do tempo, permitia suportar o insuportável. Outros reféns tiveram condições mais duras, nós sabíamos. Até pensamos: temos sorte, estamos aqui fora com essas paisagens e esse céu incrível, principalmente à noite. Depois que fui liberada, em minha primeira noite em um quarto, acordei com um sobressalto. Como não via mais estrelas no alto, entrei em pânico. Pensei: “Será que fiquei cega?”

Le Monde: A senhora foi libertada, mas seu marido e três reféns permanecem em cativeiro. Como está vivendo isso?
Larribe: Isso me assombra, é uma culpa enorme. Como ousar ser feliz enquanto eles estão lá? Também lamento muito não ter tido tempo de dizer adeus a Thierry. Naquele dia, devia ser meio-dia quando um homem anunciou: “A mulher será libertada.” Protestei: “Vocês acham que vou partir sem meu marido?” Daniel começou a argumentar comigo, dizendo que eu precisava estar fora para testemunhar e, sobretudo, por nossas filhas. Em geral, evitávamos falar sobre elas, era muito doloroso.Pensávamos que ia demorar. Incrivelmente, recebemos dois litros de água, um luxo ali, e começamos a lavar nossas roupas. Tudo estava tranquilo.  Então, um outro homem ordenou: “A mulher entra no carro”. A ação toda durou alguns minutos. Daniel me deu uma garrafa de água e um cobertor. Eu lhe deixei minhas meias e a aspirina. Foi um momento extremamente violento, uma separação dolorosa. Eu tremia. O carro partiu, ainda consigo ver o Daniel muito composto, muito digno. Fechado. Ele teve tempo de me dizer: “Consigo aguentar ainda seis meses, quem sabe oito”. Isso foi um ano e meio atrás.

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